Louveirando: Quem não tem colírio bate a cara contra o muro
Coluna de João Batista

(imagem: João Batista)
♪ POST COM TRILHA SONORA ♪
Para uma experiência mais envolvente e imersiva, ouça a música especialmente selecionada pelo autor para acompanhar a sua leitura, proporcionando uma harmonia entre som e palavra que transporta você para um ambiente de novas emoções e sensações.
Trilha Sonora: Another Brick in the Wall / Pink Floyd
Quem não tem colírio bate a cara contra o muro
por João Batista
“Muro? Que muro? Os home foi lá com as maquina e o muro mandô derruba!”
Me socorram Raul Seixas e Adoniran Barbosa, me deem uma ideia do que escrever sobre este muro que fez e faz parte da minha vida, e da vida de muitos moradores de Louveira, especificamente do Quebra, o nosso bairro Santo Antonio. O muro que circundava a Fábrica de Louças Nerina, mais precisamente no que tange à Rua Ricieri Chiquetto, deixou de existir de uma hora para a outra. E eu fiquei triste por muitos motivos, acentuado pelo fato de eu não poder filmar a demolição.
Acredito que alguém tenha ao menos fotografado, quero as fotos deste registro histórico. O muro feito de tijolos antigos de olaria era uma marca bem ali ao longo da quadra em linha reta, uma beleza. Aqui apelo ao Caetano Veloso que escreveu e cantou “da força da grana que ergue e destrói coisas belas…” Repito: foi um choque para mim chegar à noitinha no Quebra e ver que o muro não estava mais lá. Até meu carro, acredito eu, sentiu o baque. As lembranças afloram e eu me lembro que tive a esperança de que o muro seria mantido pelo novo empreendimento, mais um supermercado.
Sabe esses supermercados modernos que não é bem um supermercado, e sim um aglomerado de lojas e afins, que de novidade mesmo, nunca trazem nada. Especialmente no quesito preço. Eu sei, e inocente não sou de pensar que quando um novo empreendimento surge num local, o objetivo maior é servir a população. A mim me fala aquela vozinha que costuma comprar, e que segundo ela, tudo está muito caro, inclusive em uma cidade vizinha da nossa, com um empreendimento alcunhado com o mesmo nome. Promessas demais, entregas de menos, como tem sido até então. Sou testemunha!
Toda novidade causa um burburinho, que com o passar o tempo, pouco tempo, é atenuado pela mesmice (desculpe professora Neide de Português – que detestava a palavra mesmice), mas neste texto, esta palavra cabe muito bem. Somos experientes e já vivemos muito tempo com coisas parecidas, o que não exclui totalmente a esperança de que um dia ou uma noite, as coisas mudem para melhor, e os valores de todas as coisas, sejam ajustados com justiça, método e hombridade. Precisamos sim manter o que seja histórico. Precisamos sim ter ideias próprias e conhecer a história; ah! Chico Buarque: “tijolo com tijolo num desenho lógico.”
Daqui a algum tempo os nossos olhos acatarão as mensagens do nosso cérebro e tudo parecerá normal; entendendo que esta calçada sempre foi deste jeito feio e que o outro jeito, que não era tão bonito, mas era histórico, nunca existiu. Tristezas passam, muros caem, pessoas morrem, alegrias surgem, muros são erguidos e pessoas nascem, mas a essência do que existiu e foi bom, permanece como energia mesmo, uma energia boa, que eu, com certeza, sentirei, todas as vezes que por esta calçada passar. Progresso também se consegue restaurando nossos símbolos.


Brasileiro de Louveira, pedagogo, membro da ALLA – Academia Louveirense de Letras e Artes, colunista e criador da expressão “louveirando”; um bobo por natureza.
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