Rochas oceânicas encontradas em Campinas indicam que região estava submersa há milhões de anos atrás
Professor da Unicamp comprova que composição química e textura de rochas encontradas na região são de fundo oceânico, formadas há mais de 600 milhões de anos
Campinas é conhecida por muitas coisas: ser uma das principais cidades do interior de São Paulo, ter uma das melhores universidades do país, um centro tecnológico e cultural em expansão, um clima agradável e paisagens naturais incríveis. Mas, o que muita gente não sabe é que a cidade também guarda vestígios de um oceano que existiu há milhões de anos atrás.
Durante um passeio de bicicleta pelo Parque Ecológico Monsenhor Emílio José Salim, o professor Wagner Amaral, do Departamento de Geologia e Recursos Naturais do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, descobriu algo surpreendente sobre a geologia da região. Ele encontrou rochas de fundo oceânico em um afloramento no parque.
A partir de análises petrográficas e geoquímicas, Amaral comprovou que as rochas encontradas no parque podem estar associadas à evolução do supercontinente Gondwana. O supercontinente surgiu por volta de 550 milhões de anos atrás, quando diversos continentes se juntaram, formando uma massa de terra única. Gondwana posteriormente se fragmentou e deu origem a diversos continentes, como a América do Sul, África e Antártida.
As rochas de fundo oceânico encontradas em Campinas indicam que, há cerca de 600 milhões de anos, a região estava submersa sob o oceano. A descoberta traz uma nova perspectiva para a geologia da região e pode ajudar a entender a formação dos continentes e oceanos como conhecemos hoje.
A descoberta é de grande importância para a comunidade científica, pois permite uma melhor compreensão da história geológica da região. Como o professor explica, na região de Campinas onde se localiza o Parque, há muitos afloramentos de rochas que não haviam sido descritos anteriormente.
A partir de análises feitas no microscópio eletrônico de varredura do IG, Wagner Amaral identificou a composição química do mineral e as texturas presentes nas amostras de rochas. O microscópio revelou características que são indícios de que essas rochas alcançaram um grau metamórfico extremamente alto, característico de áreas de subducção, quando duas placas tectônicas começam a deslizar uma para debaixo da outra. As rochas do assoalho oceânico desceram sob uma outra camada, a uma profundidade superior a 45 km, sendo metamorfizadas em condições de alta pressão e, posteriormente, exumadas por processos geológicos que permitiram que fossem encontradas na superfície.
Esse metamorfismo foi datado no Laboratório de Geologia Isotópica (Lagis), do IG, a partir de análise geocronológica de um mineral chamado rutilo, o que estabeleceu a idade de aproximadamente 626 milhões de anos. Cálculos das condições de temperatura e pressão indicam que as rochas encontradas atingiram temperaturas próximas a 740°C e pressões superiores a 12 kbar.
“Ao retornar à superfície e passar por um processo de descompressão, as rochas adquiriram texturas como os simplectitos, uma espécie de intercrescimento de duas ou mais fases minerais em desequilíbrio. Assim, a rocha permaneceu, por milhões de anos, enfrentando outros movimentos tectônicos, deformações, glaciações e erosão. Esses fenômenos causaram a intemperização da rocha, deixando-a exposta em formato de afloramento”, explica Amaral
A descoberta das rochas de fundo oceânico em Campinas é importante não apenas do ponto de vista da geologia, mas também para a compreensão da história evolutiva da Terra e da vida que habita o planeta. A formação dos continentes e dos oceanos influencia diretamente o clima, a circulação de nutrientes e a distribuição dos organismos vivos ao longo do tempo. Compreender como esses processos ocorreram no passado pode nos ajudar a entender melhor como a Terra funciona como um sistema integrado.
O trabalho de Wagner Amaral e sua equipe também é importante para a divulgação da ciência e para o envolvimento da população local com a geologia. O Projeto Geobike permite que alunos e membros da comunidade participem de expedições para conhecer a geologia da região, despertando o interesse e a curiosidade pela ciência. Além disso, a descoberta das rochas de fundo oceânico em um parque urbano mostra que a ciência pode ser feita em qualquer lugar e que as descobertas mais incríveis muitas vezes estão mais próximas do que imaginamos.